A "festa" de Clarice Lispector:
ALVOROÇO DE FESTA NO CÉU
Não é
que na véspera do Carnaval houve no céu uma festa para os bichos da selva?
Os
convites foram entregues por um beija-flor que delicadamente os deixava em cima
de corolas de vitórias-régias. O bicho que ia passando via o seu nome no
envelope e pulava de alegria: tinha sido contemplado com um programa para o fim
de semana!
Mas
notaram todos que só recebiam convites os bichos de asa. O que era uma
injustiça. Pelo menos foi o que o sapo gordo pensou. Os animais de terra
estavam conformados, esperando o dia em que houvesse a festa lá na selva mesmo.
Mas, como eu disse, o sapo verde não. Todos riam dele e de suas reclamações
coaxadas e inúteis.
Ele
aproveitou o fim manso de tarde para gritar bem alto e ser bem ouvido.
— Eu
também vou!
Os
pássaros caçoaram e perguntaram:
- Cadê
tuas asas, bicho feio?
Foi
então que pensou: devo consultar quem é igual a mim, porém mais velho. E
realmente, no brejo que ficava entre samambaias e avencas, encontrou um sapo
velho e cheio de sabedoria chamado Quá-quá-quá. Este se amedrontou com as
intenções do sapo jovem:
— Olhe,
é melhor para a sua saúde não sair do chão e ter água por perto.
Então o
sapo jovem disse-lhe:
— O
senhor é capaz de guardar um segredo? Pois bem, eu vou dançar lá em cima.
Basta-me que o urubu feio leve o seu violão
Quá-quá-quá
disse-lhe que não o entendia.
O sapo
foi falar com o urubu:
— Você
vai levar seu violão, urubu?
O urubu,
de violão debaixo da asa, nem se dignou a responder.
— Senhor
urubu, quer me fazer um único favor? O de ver se estou naquela esquina?
O urubu,
meio burro, replicou que, já que era um só favor, ele iria. E não carregou o
violão. O sapo mais que depressa entrou no violão e ficou lá bem quieto, embora
tivesse uma vontade louca de fumar. O urubu voltou para lhe dizer que não o
havia encontrado na esquina — mas cadê o sapo? Sumira, pensou. E pensou: agora
vou para o céu.
Para
encurtar a história, o sapo, dentro do violão, chegou ao céu e mais do que
depressa pulou para fora e começou a dançar todo feliz. Os pássaros se espantaram,
perguntaram ao senhor sapo como havia chegado. Mas a alma do negócio é o
segredo e o sapo só respondeu malcriado:
— É que
eu me arranjo sempre!
E entrou
de novo sorrateiro no violão para ir embora. Mas o urubu percebeu a coisa e
ficou raivoso: Espertinho, não é? Pois
agora mesmo é que você vai voar, vou te soltar no ar. Então o sapo pediu
todo manhoso:
— Está
vendo aquela pedra e aquele lago? Pelo amor de Deus, deixe eu cair na pedra
porque se eu cair no lago eu me afogo!
— Pois é
no lago que eu vou te largar, para você morrer!
O sapo,
bem feliz, caiu no lago, e salvou-se.
Moral da
festa? Bem, não houve.
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